Evolução da Tecnologia do Ultrassom na Medicina
Por Priscila Dourado Evangelista e Rafael Chakr

A tecnologia do ultrassom (US) teve sua origem no meio militar, sendo utilizada inicialmente para localizar submarinos inimigos por meio das reflexões sonoras. Na década de 1940, o neurologista austríaco Karl Dussik foi pioneiro no uso do ultrassom na medicina, ao tentar detectar tumores cerebrais. Nos anos seguintes, surgiram os primeiros dispositivos de ultrassom no modo A (amplitude), que produziam ondas sonoras convertidas em gráficos lineares, semelhantes aos traçados de eletrocardiogramas (ECG). Posteriormente, com o advento do modo B (brilho), tornou-se possível a obtenção de imagens bidimensionais. Embora a resolução ainda fosse baixa e fosse necessário o uso de água para a condução sonora, já era possível identificar tumores hepáticos, aneurismas, válvulas cardíacas em movimento e até fetos.
Apenas na década de 1970 o ultrassom foi consolidado como método diagnóstico hospitalar. Isso se deveu a importantes avanços, como:
- Melhoria na qualidade das imagens, com a introdução da escala de cinza, permitindo maior definição das estruturas;
- Desenvolvimento de transdutores modernos, que dispensaram os tanques de água, utilizando apenas gel condutor;
- Avaliação em tempo real, facilitando o diagnóstico dinâmico.
Com esses avanços, países industrializados passaram a adquirir aparelhos em larga escala (como Siemens, Toshiba e General Electric), especialmente para as áreas de obstetrícia, hepatologia e cardiologia.
Na década de 1980, novos avanços consolidaram o ultrassom como ferramenta indispensável nas especialidades médicas, destacando-se:
- Introdução do Doppler colorido;
- Criação de transdutores especializados (endocavitários, transesofágicos e intraoperatórios);
- Digitalização e armazenamento de imagens;
- Entrada do ultrassom nas emergências, com papel fundamental no atendimento rápido, na avaliação de traumas abdominais, gestantes, acessos vasculares e procedimentos intervencionistas.
A evolução para aparelhos portáteis, aliados à introdução de softwares inteligentes, permitiu que o ultrassom se tornasse acessível não só em grandes hospitais, mas também em clínicas de média e baixa complexidade. Especialidades como reumatologia, anestesiologia e medicina de emergência passaram a utilizar o ultrassom como ferramenta de diagnóstico e de apoio a procedimentos, inclusive à beira-leito, com a modalidade point-of-care ultrasound (POCUS).
Após o raio-X, o ultrassom é atualmente a tecnologia de imagem diagnóstica mais utilizada no mundo, por ser seguro, de baixo custo, portátil e altamente versátil. Atualmente, o ultrassom avança rapidamente, incorporando inteligência artificial e recursos de telemedicina, o que amplia ainda mais seu potencial diagnóstico e sua aplicabilidade.
Principais Doenças Diagnosticadas por Ultrassom nas Diferentes Especialidades
Embora não haja um número exato e universal de doenças diagnosticadas exclusivamente por ultrassom, estima-se que diversas condições se beneficiem desse método pela sua eficácia, segurança e custo-benefício. A seguir, alguns exemplos por especialidade:
- Obstetrícia e Ginecologia
- Gravidez ectópica (diagnóstico essencial pelo US transvaginal)
- Anomalias fetais (microcefalia, macrocefalia, malformações oculares)
- Endometriose (padrão ouro na avaliação inicial com US transvaginal)
- Detecção de miomas uterinos
- Cardiologia
- Defeitos cardíacos congênitos (ex.: comunicação interatrial - CIA)
- Avaliação de fluxo e valvopatias por ecocardiografia (Doppler/2D)
- Emergência
- Pneumonias, edema pulmonar, derrames pleurais (POCUS)
- Avaliação de trauma (FAST) — padrão global
- Diagnóstico rápido de colelitíase, apendicite, aneurisma de aorta e cálculos renais
- Gastroenterologia
- Avaliação de hepatopatias, patologia inflamatórias no intestino, doenças da vesícula, fígado e baço
- Ortopedia e Traumatologia
- Diagnóstico de fraturas em crianças (<12 anos), como punho e clavícula (sensibilidade de 96% e especificidade de 100%)
- Neurologia Pediátrica
- Hemorragia intraventricular, leucomalácia periventricular e hidrocefalia em neonatos
- Cabeça e Pescoço
- Caracterização de lesões em parótida, tireoide e diferenciação entre tumores e cistos
- Mastologia
- Avaliação de descarga papilar patológica (acurácia diagnóstica ~84% com US de alta frequência)
- Vascular
- Diagnóstico de aterosclerose, trombose venosa profunda, placas carotídeas vulneráveis (com Doppler e POCUS)
- Oftalmologia
- Avaliação de uveítes e lesões intraoculares
- Reumatologia
- Avaliação de artrite reumatoide, artrite psoriásica, tendinites, bursites, entesites e artropatias microcristalinas (gota e pseudogota)
- Dermatologia
- Diagnóstico de psoríase, entesopatia de unhas, neoplasias cutâneas, dermatites e pênfigo
Com os avanços constantes, especialmente na inteligência artificial e na telemedicina, o ultrassom segue expandindo suas fronteiras, permitindo diagnósticos cada vez mais precisos, rápidos e acessíveis.
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